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Emoções difíceis
Indo directo ao assunto

(...) Nem tudo é dias de sol,
E a chuva, quando falta muito, pede-se
Por isso tomo a infelicidade com a felicidade
Naturalmente, como quem não estranha
Que haja montanhas e planícies
E que haja rochedos e erva...

O que é preciso é ser-se natural e calmo
Na felicidade ou na infelicidade,
Sentir como quem olha,
Pensar como quem anda,
E quando se vai morrer, lembrar-se de que o dia morre,
E que o poente é belo e é bela a noite que fica...
Assim é e assim seja...


Fernando Pessoa  
“O Guardador de Rebanhos”.
In: Poemas de Alberto Caeiro. Lisboa: Ática, 1946

. . .

Falar sobre emoções difíceis como tristeza, medo, raiva, aversão(nojo) e outras é fundamental porque nos ajuda a compreender melhor o que estamos a sentir, favorece o autoconhecimento e fortalece a nossa saúde mental. Ao expressarmos essas emoções, evitamos que elas se acumulem de forma prejudicial, o que pode levar a sintomas físicos e psicológicos.

Além disso, partilhar o que sentimos cria conexões mais profundas com as pessoas ao nosso redor, promovendo empatia, apoio mútuo e relações mais saudáveis. Reconhecer e validar essas emoções é um passo essencial para lidar com elas de maneira construtiva.

Porque chamamos Emoções Difíceis a estas emoções e não lhes chamamos Emoções Negativas?
Chamamos a essas emoções de "difíceis" e não de "negativas" porque elas, apesar de desconfortáveis, não são más ou erradas. O termo "negativas" sugere algo a ser evitado ou reprimido, enquanto "difíceis" reconhece que são naturais, trazem informações importantes (como medo sinalizando perigo ou raiva mostrando limites violados) e apenas exigem mais esforço para serem sentidas e reguladas. Assim, em vez de rejeitá-las, aprendemos a acolhê-las e a lidar com elas de forma saudável.

Tristeza
A tristeza tem uma função importante: ela sinaliza que algo significativo foi perdido ou que uma expectativa não foi atingida. Essa emoção convida-nos a parar, refletir e processar o que aconteceu, ajudando na adaptação a novas realidades. Além disso, a tristeza pode:

  • Promover introspecção, levando à compreensão dos nossos sentimentos e necessidades;
  • Estimular o pedido de apoio, aproximando-nos de outras pessoas e fortalecendo vínculos;
  • Favorecer o descanso e a recuperação emocional, ao reduzir o ritmo e direcionar energia para o cuidado interno.

Medo
O medo tem a função principal de proteger a nossa sobrevivência. Ele é uma resposta emocional que nos alerta para possíveis perigos ou ameaças, preparando o corpo e a mente para reagir. Essa reacção activa mecanismos fisiológicos (como aumento da frequência cardíaca e produção de adrenalina) que nos ajudam a lutar, fugir ou nos proteger.

Além da protecção imediata, o medo também:

  • Promove cautela, ajudando a evitar riscos desnecessários;
  • Estimula a aprendizagem, pois experiências assustadoras ensinam a prevenir situações semelhantes;
  • Favorece a adaptação, ajustando o nosso comportamento diante de novos desafios ou incertezas.

Ou seja, embora desconfortável, o medo é essencial para a segurança e preservação da vida.


Raiva
A raiva tem a função de proteger e defender os nossos limites. Ela surge quando percebemos injustiça, desrespeito ou ameaça, mobilizando energia para agir e corrigir a situação. Essa emoção:

  • Sinaliza que algo está errado, pedindo atenção e mudança;
  • Dá força e motivação para enfrentar desafios ou impor limites;
  • Promove a autoafirmação, ajudando a expressar necessidades e defender direitos.

Quando bem regulada, a raiva é uma aliada para restabelecer o equilíbrio e a justiça. O problema surge apenas quando ela é reprimida (gerando ressentimento) ou expressa de forma destrutiva.


Aversão ou nojo
O nojo tem a função de proteger o organismo contra aquilo que pode ser prejudicial ou perigoso. Ele provoca uma reação de repulsa diante de substâncias, alimentos ou situações potencialmente contaminadas ou tóxicas, evitando que entremos em contacto com elas. Além da dimensão física, o nojo também actua no campo social e moral:

  • Proteção física: evita a ingestão ou contacto com elementos que possam causar doença ou mal-estar.
  • Protecção social/moral: gera rejeição a comportamentos ou situações que consideramos antiéticos, indecentes ou degradantes, ajudando a manter normas sociais.

Assim, o nojo funciona como um mecanismo de defesa, preservando tanto a saúde física quanto os valores pessoais e sociais.


Podemos ver que cada uma destas emoções primárias tem a sua utilidade e lembrarmo-nos que a forma mais inteligente e eficaz de lidar com elas passa muito por reconhecer essa mesma utilidade: aconlhendo-as, compreendendo-as e exprimindo-as ou manifestando-as de uma forma tão saudável quanto possível.
Se o conseguirmos fazer, auto-regulando essas emoções, grande parte dos nossos problemas ou questões emocionais se atenuarão e viveremos num nível de equilíbrio mais saudável, tanto físico como mental.

Mário Rui Santos
hipnoterapeuta – www.Hipnose.pro  
formador da Hypnos/A-GPHM – www.Hipnoterapia.pro
presidente da Associação-Grupo Português de Hipnose e Motivação – www.Hipno.pt

*a pedido do autor, este texto não segue as normas do acordo ortográfico


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