Avançar para o conteúdo principal

Saber dizer “Não” e impor limites

 

Saber dizer “Não” e impor limites

- artigo publicado na revista Saúde Actual - ed.Nov/Dez 2022
. . .

Começar a dizer "não" a certas coisas, não significa que se é egoísta...
Significa que nos respeitamos.
. . .
Na base de muitas perturbações emocionais - que poderão derivar em problemas de ansiedade ou crises depressivas – encontra-se um específico mas muito importante problema que muitas pessoas carregam consigo: a dificuldade de dizer “não”.
Mas apesar de muitas e muitas pessoas serem afectadas com esta situação poucas se propõem a trabalhá-la, banalizando-a, relativizando-a ou assumindo-a como uma característica imutável da sua personalidade.
Outras ainda, aceitam-na como um traço da sua bondade e humana qualidade, olhando para ela como uma espécie de nobre fardo que precisam de carregar.
Hoje em dia, na literatura de auto-conhecimento e de desenvolvimento pessoal, propaga-se cada vez mais a importância de se praticar este “dizer não”, defendendo esta prática como algo fundamental para a nossa existência humana e bem-estar emocional.
Impormos limites, sermos assertivos, exprimir os nossos sentimentos e emoções, defender as nossas opiniões e posições, fazermo-nos respeitar e defender a nossa dignidade, poderiam ser procedimentos a serem-nos ensinados na escola primária, mas infelizmente acontece – na maior parte das vezes – exactamente o contrário.
Assim, parece começar a existir uma cada vez maior sensibilização para este assunto. Chegando mesmo a surgir nos órgãos de comunicação social um cada vez maior número de artigos sobre esta matéria da defesa dos nossos limites, tanto a nível familiar ou sentimental, como profissional.
No entanto, apesar desta sensibilização e alguma conseguida consciencialização as dificuldades permanecem em muitas pessoas que um dia se decidem a “treinar” este novo procedimento nas suas vidas.
E porquê?!
"Dentro" desta dificuldade pessoal de se dizer "não" aos outros, entre outras possíveis razões, existe um universo imenso e variado de crenças/convicções, experiências e vivências, que importa identificar e trazer à consciência.
Sem fazermos este trabalho interior que passa pela consciencialização destes condicionamentos, dificilmente seremos capazes de ser mais assertivos – uma vez que estes anzóis, ganchos ou feridas do nosso passado continuarão a bloquear-nos.
Algumas a saber:
- Evitar confrontos, discussões ou confusões – “Não te metas em confusões”
Esta perspectiva - que desde cedo se pode ter instalado e enraízado - de que se devem evitar as confusões, os confrontos, os conflitos, as discussões… é muito difundida por figuras parentais e nas famílias, de forma geral.
Se por um lado esta atitude (crença) parece até ser razoável e saudável, com muitos de nós ela pode transformar-se numa espécie de directiva ou mandamento que nos leva a evitar tudo aquilo que se enquadre na categoria de confronto.
Se a tivermos, há que observar e actualizar essa crença.
E poderá ser por aí o princípio da nossa afirmação pessoal.
- “Temos de estar bem com toda a gente”
A velha máxima de agradar a gregos e troianos poderá levar-nos à preocupação constante de querer agradar a toda a gente. Pagando nós o preço de nos obrigarmos a aceitar ou permitir situações que não deverão ser permitidas.
Esta atitude poderá levar a que nos desrespeitemos muitas vezes a nós próprios, anulando-nos ou “engolindo sapos”.
Será importante rever esta directiva para uma nova perspectiva em que aceitamos que algumas pessoas poderão não gostar de nós – e tudo bem.
- “Preciso que as pessoas gostem de mim”
Se nós próprios nos recriminamos, acusamos, desvalorizamos, criticamos numa espécie de zanga crónica connosco, esse poderá ser um dos pesados factores a fazerem-nos depender do reconhecimento ou aprovação dos outros.
Neste caso será fundamental trabalhar e esclarecer esse “desamor-próprio” para que se possa reduzir essa dependência do outro e assim lidarmos melhor com essas rejeições externas.
- “Não gosto de ver ninguém a sofrer ou a precisar de ajuda”
Esta empatia ou bondade empolada poderá ser um anzol que prende a pessoa à disponibilidade excessiva, tornando-a refém de uma espécie de piloto-automático que a obriga a estar sempre disponível e a ter muita dificuldade em dizer não ou impor limites.
Algumas personagens com características mais manipuladores apercebem-se desse traço de personalidade e exploram-no nos mais diversos tipos de relações.
Neste tipo de condicionamento, encontramos muitas vezes na história da pessoa que tem esta dificuldade, situações de contacto próximo com o sofrimento humano ou a própria pessoa ter passado por situações de dor/sofrimento emocional – tornando-a mais sensível a este tipo de circunstâncias.
. . .
Para além destas situações-tipo, muitas outras poderão ser encontradas como forças de bloqueio para uma atitude mais assertiva.
Daí ser tão importante olhar com atenção para a história pessoal de cada um e perceber estes e outros anzóis, ganchos, correntes ou bloqueios.
Dizer "não" é uma das competências humanas e sociais mais importantes, que temos a aprender e praticar.
Ao aprendermos a dizer "não", interna e externamente, aprendemos a dizer "não" a pensamentos e comportamentos, a dizer "não" a pessoas e situações.
Se houver algo ou alguém que não respeite o nosso "não" com vitimizações ou acusações de egoísmo, será bom afastarmo-nos. Física e/ou emocionalmente, criar distância.
Dizer “não” e impor limites é fundamental na prática e vivência do nosso amor próprio.
Possamos assim todos vivê-lo.
Mário Rui Santos
hipnoterapeuta – www.Hipnose.pro
formador da Hypnos/A-GPHM – www.Hipnoterapia.pro
presidente da Associação-Grupo Português de Hipnose e Motivação – www.Hipno.pt
*a pedido do autor, este texto não segue as normas do acordo ortográfico


Comentários

Mensagens populares deste blogue

Um caminho para a Luz, apenas um caminho...

Falamos e ouvimos falar tanto da Luz. De uma Luz. Uma Luz que nos ilumina, que nos acompanha, que está dentro de nós. Para alguns essa Luz é Deus, para outros o Universo, a força do Universo, a Energia Universal, o Ki, o Amor, a Paz. A Luz é tanto em nós e quanto mais nos sentimos no seu caminho mais a enriquecemos conceptualmente, tornando-a mais rica e poderosa. Para outros que se sentem distantes deste conceito, admitir a possibilidade de uma Luz, que ilumina e acompanha o seu ser é uma proposta de alienação do seu próprio conhecimento ou auto-construção. É algo que não faz sentido porque os distrai de si mesmos. A estes direi que a Luz de aqui falo-escrevo é também exactamente isso: o seu próprio conhecimento e força de construção. Assim, seja você uma pessoa mais racional ou uma pessoa mais espiritual, a proposta de caminho que aqui lhe deixo é uma proposta pragmática e universal. Que será tanto ou mais espiritual, tanto ou mais racional, conforme o seu próprio sistema de crenças

Mudança – O eterno caminho humano

Mudança – O eterno caminho humano (artigo publicado na Revista Saúde Actual - Nov/Dez 2024) "A mudança é a essência da vida." Reinhold Niebuhr A vida é mudança, evolução, crescimento, expansão. Aceitar e abraçar a vida é abrirmo-nos a esse crescimento, a essa constante mudança. A mudança de aspectos da nossa personalidade é sempre um tema controverso que gera, por vezes, discussões acesas - completamente desnecessárias, a meu ver. Isto porque há quem defenda acerrimamente a ideia de que as pessoas não mudam, elas apenas são como são e vão-se revelando ao longo do tempo. E, por outro lado, há quem defenda que as pessoas mudam e que em alguns casos até devem de mudar. No entanto, a discussão não se coloca entre se as pessoas mudam ou não mudam, mas sim na constatação biológica que todo o ser vivo tem um potencial adaptativo e evolutivo - como tal, tem um potencial ou possibilidade de mudança. "Mas se assim é, porque é que algumas pessoas parecem ficar cristalizadas e por

"Deu-lhe o amoque !"

Já ouviram com certeza esta expressão atribuída a alguém que não estaria nas suas melhores condições psicológicas. O que provavelmente não saberão é que este "amoque" é, de facto, um "amok". "Amok" é a palavra malaia que significa "louco de raiva". Muitas vezes usada de forma coloquial e em contexto menos violento, esta expressão define um comportamento sociopata em que um indivíduo, sem qualquer antecedente de violência, se mune de uma arma e tenta ferir ou matar alguém que apareça à sua frente. Estas crises de "amok" eram normalmente "curadas" com a morte do indivíduo em causa.