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Os sofrimentos de estimação e o bendito chefe


Recentemente perguntei a alguém que se sentia profundamente incomodado por um colega de trabalho, neste caso um chefe, se ele me conseguia fazer uma listagem das coisas que mais o incomodavam na vida - para além desse chefe.

E mais. À medida que ele fosse fazendo essa lista iria atribuindo uma classificação, um valor, a cada situação. Com a condição de que a soma desses valores não poderia ser superior a 100.

E assim, fomos fazendo a lista. Tendo sido a primeira situação dessa lista exactamente aquele chefe. Várias situações foram sendo acrescentadas e revalorizadas, sabendo sempre que o limite da soma não poderia ser superior a 100.

Inicialmente ao chefe atribuímos um valor de 30, mas à medida que fomos avançando na lista o "pobre" do chefe foi reduzido a uns míseros 5. Percebemos então que a lista apesar de não ser muito extensa era diversificada, contendo outras situações que perturbavam a vida daquele homem.

Foi nesse momento que constatámos a utilidade daquele sofrimento e o importantíssimo papel daquele "chefe" na vida daquele homem: é complexo demais para qualquer ser humano gerir múltiplos sofrimentos, assim encontramos um para transferir essa carga e gestão complexa. Com todas as vantagens e desvantagens.

Assim somos nós, nesta nossa vida. Inconscientemente, numa fracção de segundo transferimos todo o nosso sofrimento ou perturbação para aquela que está mais à mão, ou que de alguma forma é mais recorrente.

Para alguns é o trânsito, para outros o vizinho do lado, o colega da escola, o marido, a mulher, os filhos, a sogra, o clube que perde, o árbitro, a política, a vida, o carro, etc. Vamos encontrando sofrimentos de estimação, perturbações ou incómodos provisórios para descarregar as nossas raivas. E alguns deles tornam-se mesmo sofrimentos de estimação, como aquele bendito, importante e utilíssimo chefe.

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"Tornar-se espectador da própria vida permite escapar aos sofrimentos da vida ."
Oscar Wilde

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"Natural Blues" - Moby

Comentários

Anónimo disse…
Concordo Mário!
Ser espectador da própria vida, tomar conhecimento das circunstâncias que a envolvem e de nós mesmos, faz com que aceitemos a Responsabilidade de a gerir da forma mais positiva e permite-nos compreender as suas incongruências.
Caminhar atento, vigilante, sereno, ter "Deus" dentro de nós todos os dias, lava-nos de todo o sofrimento. Em três palavras, Responsabilidade, Aceitação e Gratidão.
Anónimo disse…
Este já conhecia ;) abraço
Xicha disse…
A palavrinha mágica é mesmo ACEITAÇAO , reclamar pouco e fazer sempre melhor, direito á indignação, sim, com conta peso e medida ,
No fundo a nossa vida somos nós que a escolhemos, os outros á volta, fazem apenas parte dela e ainda bem ...
:)
Abraço
XI
Margarida Ramos disse…
Qual quê? espectador da própria!
Actor e espectador em simultâneo.
Quem é que vai a um concerto e não quer participar à sua maneira.
Espectacular a canção as imagens, o que transmite....
Anónimo disse…
Vou passar a tratar melhor o meu chefe ;-) - fica bem
rusa disse…
também acho que tens razao Mário, o facto de estarmos longe faz-nos perceber que às vezes ampliamos a dimensao das coisas a que chamamos problemas.
Afinal nem por isso sao problemas. Antes desafios.
Um abraço

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