Desde os 14 anos...desde aquele dia em que cheguei a casa, já tarde. Explicava Alberto. Desde aquela altura em que vi aquela figura à janela que sinto o que ainda sinto hoje com quase quarenta anos. Sinto esta presença que me angustia. Tenho medo de fechar os olhos e senti-la. Continuava.
E se fechasse os olhos agora Alberto ? Seria capaz de a sentir ? - perguntei-lhe.
Alberto olhou-me surpreendido, quase não acreditando naquilo que ouvia. E repeti: Seria capaz de a sentir ? Experimente ! Feche os olhos...calma e tranquilamente. Estou aqui consigo.
Alberto confiou e quase instantaneamente o seu corpo teve uma contracção imediata, dando-me a deixa para lhe perguntar: sente ?
Sim, disse-me Alberto nitidamente incomodado. Ela está aqui. Move-se de canto em canto desta sala.
Mantenha-se calmo, dizia-lhe eu. Acha que consegue comunicar com essa energia ?
Silêncio....
Sim, respondeu finalmente.
Pergunte-lhe o que quer de si.
Silêncio...
Diz que está aqui para me ajudar. E Alberto iniciava uma expressão mais descontraída.
Sente que pode confiar nessa resposta, Alberto ?
E quase abrindo um sorriso, respondeu-me...sim, sei que posso.
Então aceite a ajuda, estenda-lhe a mão.
Foi nessa altura que aquela malha negra, metálica e pesada, que envolvia o coração de Alberto há algumas dúzias de anos, se dissolveu. Contagiada por um ácido de luz, que no seu lugar apenas deixava uma leve cicatriz.
Os ombros de Alberto levantaram e as rugas da testa tranquilizaram. Respirava. Respirava fundo, em alívio. Ainda sorrindo.
Disse-me mais tarde que aquele estender de mão se transformou num abraço mútuo, como o de dois bons amigos que há muito tempo não se viam.
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"Os homens devem saber que só Deus e os anjos podem ser espectadores do teatro da vida humana."
Francis Bacon
Comentários
Quando acreditamos, quando sentimos e principalmente quando estendemos a mão... e o abraço... que bom que deve ser!!!
O pior é que mesmo qd temos consciência dos perigos do medo, nem sempre conseguimos evitar senti-lo :)
Felicidades para o Alberto
Abraço p ti Mário
Xi
Ouvi então ao longe o Gustavo a acalmá-la e a dizer-lhe: Beatriz, quando tu sonhares com monstros ou outras coisas assim más, o que tens de fazer é parar voltar-te para trás e veres que essas coisas más ou esses monstros se transformam. Transformam-se em borboletas e voam para longe.
O Gustavo tem nove anos e a Beatriz tem sete.
Para MR uma brisa suave nesta saudação :)