Desilusões, decepções, ingratidões e outras confusões
Pensamos nós que ao ajudar alguém, quando precisarmos desse alguém esse alguém estará por lá para nos apoiar. Mesmo que conscientemente não façamos essas contas de dever e a haver, há parte de nós que parece tomar nota dessa nossa dádiva e a expectativa fica. Oh quão confusos, enganados e tristes andamos nós.
Quando cometemos esse ignóbil acto inconsciente estamos a colocar-nos uma grilheta de expectativa que nos vai prender a um passado de acumulados positivos e negativos. E esse acumulado pesa já por si. É um acumulado de aprendizagens e deve ser apenas considerado como tal. Se o usarmos como condicionamento de bloqueio de futuras experiências estamos a criar o terreno para que surjam as tais desilusões, decepções, ingratidões e outras confusões. E isso impede-nos de desfrutar a vida e continuar a aprender.
Se no trânsito damos passagem a alguém que, apesar de não ter prioridade sobre nós, procura sair de uma garagem com o seu carro, esse alguém normalmente aproveita e segue o seu caminho. Se não nos agradecer, arrependemo-nos do que fizemos ? Não o voltamos a fazer porque pensamos que as pessoas são todas umas ingratas, etc. ?
E se um dia mais tarde somos nós a sair de uma garagem, com o trânsito parado, e reparamos que o próximo condutor - aquele a que nós possibilitamos a saída da garagem, dias antes - é aquele que nos pode deixar passar ? E se em vez de nos deixar passar, simplesmente nos ignora ? Ficamos incomodados com isso ? Resmungamos connosco próprios, ressentidos ?
Para quê ?
Nós damos porque gostamos de dar, ajudamos porque gostamos de ajudar, apoiamos porque sim, porque é a nossa natureza, a nossa forma de estar na vida. E independentemente de qualquer prova de gratidão ou recompensa do exterior, há sempre um ser que se sente muito bem com todo este processo: nós próprios.
Poder dar, ajudar ou apoiar é em si uma dádiva. Pessoalmente, considero-me grato por poder dar e isso cria em mim uma dinâmica de dessensibilização em relação a qualquer prova de gratidão. Não preciso que ninguém me agradeça, porque eu próprio já estou grato em poder dar.
Tudo o que vier a mais será abraçado e bem recebido, um sorriso, um obrigado ou um olhar.
E perguntar-me-ão, mas isso não é desgastante ? Dar, apoiar, ajudar por ajudar ?
E eu respondo-vos: se vocês vivem em luz e ajudam alguém a enroscar uma lâmpada ficarão às escuras ?
Por isso dêem, ajudem, apoiem, amem porque sim. Porque há uma parte de vós que se satisfaz, que se ilumina, que vos nutre e torna mais fortes.
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"Só há felicidade se não exigirmos nada do amanhã e aceitarmos do hoje, com gratidão, o que nos trouxer. A hora mágica chega sempre."
Hermann Hesse
9 Comments:
Vou experimentando :)
Também cada vez espero menos uma gratidão externa e encontro-me com a minha, mas não é fácil ;) abraço
How true!!
Infelizmente até existem pessoas que exploram estes sentimentos em forma de “chantagem emocional” e ficam chocadas quando levam com a resposta “ninguém te pediu”…
Fazemos porque queremos…ninguém nos fica a dever…
Isso dito…também é verdade que andamos tão egotistas que esquecemos de agradecer as pequenas coisas… Devermos saber dar, mas mais generoso é aquele que sabe receber… :)
Também penso assim. Aprendi a ficar alerta para ós mini-milagres que acontecem durante a minha vida e Dar Graças, Sempre!
Alguém me disse um dia, depois de um conjunto de lista de decepções, desilusões e ingratidões que lhe descrevia - algumas com intensidade dramática - que eu estava mesmo zangado, zangado com o mundo.
Nessa altura não aceitei muito bem aquele comentário.
Quem era esse alguém para me adjectivar - por muito amigo meu que o considerasse.
Quem era ele que não tinha partilhado os meus sofrimentos interiores, para me sintetizar assim ?
E fiquei zangado. Também com ele.
Pois, também.
Com alguma distância de espaço e tempo, fui constatando o que ele me havia dito.
Mas fui também constatando a lacuna no que ele não me tinha dito.
Constatei que estava zangado, mas não só.
Primeiro constatei que estava zangado não com essas pessoas ou situações, mas comigo próprio. Porque a maior parte delas (situações) ocorreram na minha idade adulta e poderia tê-las gerido de uma outra forma. E assim, percebi que me zanguei comigo para ter um marcador emocional de aprendizagem. Para aprender, não a evitá-las mas a passar por elas de outra forma.
Em segundo lugar, constatei que sim que me zanguei mas que tenho direito a zangar-me. Mas com este fantástico direito tenho também uma responsabilidade e capacidade. A responsabilidade e a capacidade de resolver esta minha zanga interior.
E assim vou experimentando fazê-lo.
Desilusões, decepções, ingratidões e outras confusões, iremos nós ter pela vida toda, a questão aprender a lidar com elas sejam da nossa parte ou dos outros da melhor maneira ...
Abraço
Xi
Ando a treinar. Ando a treinar e vou vendo resultados... mas ainda me falta tanto caminho :)
desculpa mas acho que ambas dar e receber tem exatamente a mesma importancia tenho um passado presente e talvez futuro de quase só dar e o saldo nao é positivo
Depende da forma como damos - se somos obrigados a dar sem receber, não damos nada, apenas nos sacrificamos.
Se damos porque gostamos de dar, porque nos sentimos bem a dar, então aí vamos sempre recebendo também.
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