2007/10/10

A síndrome da montanha


Imagine-se no sopé de uma montanha, que supostamente deveria subir. Olha para o topo da montanha, calcula aproximadamente o esforço que tem de fazer para a subir, e mentalmente a sua criatividade apresenta-lhe vinte razões para não começar a escalá-la agora. Este não é o melhor momento, não apetece, está cansado, tem de recuperar forças, tem de fazer ainda algo antes, etc. etc.
De repente olha para um dos seus lados e vê mais outras vinte montanhas que o convidam, quase provocam. Outro argumento rapidamente se coloca na sua mente. Aquela montanha que tem à sua frente não é provavelmente a mais prioritária, mas sim talvez aquela mais a norte ou aquela outra a oeste.

E à lista dos argumentos é acrescentada uma montanha de outros argumentos para não subir aquela montanha. Fica parado entre os sopés das várias montanhas que o rodeiam. Talvez à espera que as suas pernas ganhem vida própria e comecem elas uma escalada que não lhe apetece. Mas elas muito dificilmente tomarão essa iniciativa.

Nesse momento o seu olhar não se concentra no topo da montanha mas naquilo que lhe parece ser um trilho, num caminho para o topo. Aproxima-se e repara em alguns outros pormenores desse caminho, como pontos de apoio. E tudo lhe indica que essa parece ser uma boa forma de chegar ao topo. Não olhando para o topo, repara igualmente em mais dois outros caminhos, e decide-se por um.

Inicia a sua subida, desfrutando da caminhada. Quase com um sorriso.
Sente-se mais próximo do céu, mais leve, até que decide olhar finalmente para o topo dessa montanha mas não o vê.
Olha à sua volta, para cima, mas não o consegue perceber. Apenas repara num importante pormenor, todos os topos das outras montanhas que o rodeavam estão agora ao seu nível.
E sorri.

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"No perfume das flores de ameixa, O sol de súbito surge -Ah, o caminho da montanha!"
Matsuo Bashō (poeta japonês - séc.XVII)

6 Comments:

Anonymous Anónimo said...

Às vezes já eu subi duas montanhas e quando olho para trás e penso no tempo que demorei a pensar se subia se não subia a primeira, olho com pena do tempo que perdi...

quarta-feira, outubro 10, 2007 3:41:00 da tarde  
Anonymous Anónimo said...

Isto parece-me procrastinação - será ? ;)

quarta-feira, outubro 10, 2007 7:19:00 da tarde  
Blogger African Queen said...

Lindo... é uma metáfora que se aplica de facto à vida. Eu faço montanhismo e já subi umas montanhas e no princípio o meu maior problema era sempre acordar muito cedo, ainda de madrugada, para atacar a montanha e nunca houve uma única vez em que não tivesse ficado feliz por ter vencido a preguiça e ter visto o sol a nascer e a vida a acordar.

quarta-feira, outubro 10, 2007 8:09:00 da tarde  
Anonymous Anónimo said...

É uma boa imagem esta das montanhas, especialmente quando nós pensamos que elas nos tapam o Sol, e afinal o que elas querem é por-nos mais próximos dele

quarta-feira, outubro 10, 2007 10:08:00 da tarde  
Blogger Xicha said...

Já subi algumas pequenas montanhas engraçado que até agora nunca pensei no esforço que vai ser antes de começar, penso depois porque o sinto no fisico, mas continuo a achar que as descidas por vezes são mais dificeis...
abraço p Ti Mário
Xi

quinta-feira, outubro 11, 2007 12:10:00 da tarde  
Blogger SA said...

a vida tem de ser sempre a subir essas montanhas, apesar das escorregadelas

sexta-feira, outubro 12, 2007 7:28:00 da tarde  

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