Avançar para o conteúdo principal

Condição para a coragem


É frequente eu ouvir dizer por parte de algumas pessoas com quem trabalho algo como: "não tenho coragem para fazer isso". Muito frequente.
Mas é interessante constatar a coragem que têm para sofrerem as consequências de não o fazerem. São os corajosos silenciosos.
Os corajosos que preferem ir sofrendo em silêncio, infligindo a si próprios as consequências de não agirem para a mudança.
Corajosos que têm a força de vontade para aceitar em silêncio aquilo que os incomoda. Que têm o poder de "engolir" em alternativa à acção, de fazer aquilo que alegadamente fará sofrer outra pessoa. Embora, provavelmente, continuem perpetuando sofrimentos, deles e de outros.
Corajosos que têm a "bravura" de projectar as suas frustrações em outros que nada têm a ver com a fonte dessas mesmas frustrações.
Corajosos que preferem ficar doentes porque reprimem sentimentos, porque a alternativa seria falar sobre algo que poderia incomodar alguém.
Corajosos que preferem tolerar em vez de chamar a atenção para algo que não está bem.
Corajosos que preferem criticar em vez de sugerir o que se pode fazer melhor.

A coragem é uma qualidade inata, que normalmente usamos da forma mais exigente: contra nós próprios.
Usá-la para o nosso bem e para o bem de quem nos rodeia é um exercício libertador, que nos responsabiliza mas que também nos torna mais felizes, mais atentos à vida e às coisas boas que ela tem para nos dar.
A coragem está na nossa matriz, no nosso ser, nas nossas células, mas enganamo-nos muitas vezes na sua utilização. E esforçamo-nos nesse erro.

É por isso que aquele que durante grande parte da sua vida sofreu em silêncio, tem as condições para falar sem gritar.
Aquele que aceitou, pode mudar.
Aquele que se sente frustrado, pode criar e produzir o bem.
Aquele que fica doente por reprimir os sentimentos, pode falar e ter as condições para estar saudável.
Aquele que tolerou, pode chamar a atenção.
Aquele que criticou, pode sugerir e ajudar a construir.
Aquele que usou a sua coragem contra si próprio, pode usá-la por si de uma forma libertadora.

Aquele que durante anos se esforçou para exercer a sua coragem contra si próprio, tem a condição e a responsabilidade para a deixar fluir por si e pelo seu bem-estar.

---
"DEUS concede-me a serenidade para aceitar as coisas que não posso mudar
A coragem para mudar as coisas que posso
E a sabedoria para saber a diferença."

Reinhold Niebuhr

Comentários

Anónimo disse…
Deus me dê a coragem para deixar fluir a minha coragem
Anónimo disse…
Mario, como vc tem essa sabedoria? Durante todo o dia de hoje pedi a Deus para me mostrar o melhor caminho para uma decisão que preciso tomar, muito séria. Esperei... esperei... antes de dormir, quase 1h00 resolvi olhar seu blog e... Ops! Tava lá a resposta!
Caramba!
Obrigada!
todos temos essa sabedoria, só que às vezes esquecemo-nos dela ;) abraço

Mensagens populares deste blogue

Um caminho para a Luz, apenas um caminho...

Falamos e ouvimos falar tanto da Luz. De uma Luz. Uma Luz que nos ilumina, que nos acompanha, que está dentro de nós. Para alguns essa Luz é Deus, para outros o Universo, a força do Universo, a Energia Universal, o Ki, o Amor, a Paz. A Luz é tanto em nós e quanto mais nos sentimos no seu caminho mais a enriquecemos conceptualmente, tornando-a mais rica e poderosa. Para outros que se sentem distantes deste conceito, admitir a possibilidade de uma Luz, que ilumina e acompanha o seu ser é uma proposta de alienação do seu próprio conhecimento ou auto-construção. É algo que não faz sentido porque os distrai de si mesmos. A estes direi que a Luz de aqui falo-escrevo é também exactamente isso: o seu próprio conhecimento e força de construção. Assim, seja você uma pessoa mais racional ou uma pessoa mais espiritual, a proposta de caminho que aqui lhe deixo é uma proposta pragmática e universal. Que será tanto ou mais espiritual, tanto ou mais racional, conforme o seu próprio sistema de crenças

Mudança – O eterno caminho humano

Mudança – O eterno caminho humano (artigo publicado na Revista Saúde Actual - Nov/Dez 2024) "A mudança é a essência da vida." Reinhold Niebuhr A vida é mudança, evolução, crescimento, expansão. Aceitar e abraçar a vida é abrirmo-nos a esse crescimento, a essa constante mudança. A mudança de aspectos da nossa personalidade é sempre um tema controverso que gera, por vezes, discussões acesas - completamente desnecessárias, a meu ver. Isto porque há quem defenda acerrimamente a ideia de que as pessoas não mudam, elas apenas são como são e vão-se revelando ao longo do tempo. E, por outro lado, há quem defenda que as pessoas mudam e que em alguns casos até devem de mudar. No entanto, a discussão não se coloca entre se as pessoas mudam ou não mudam, mas sim na constatação biológica que todo o ser vivo tem um potencial adaptativo e evolutivo - como tal, tem um potencial ou possibilidade de mudança. "Mas se assim é, porque é que algumas pessoas parecem ficar cristalizadas e por

"Deu-lhe o amoque !"

Já ouviram com certeza esta expressão atribuída a alguém que não estaria nas suas melhores condições psicológicas. O que provavelmente não saberão é que este "amoque" é, de facto, um "amok". "Amok" é a palavra malaia que significa "louco de raiva". Muitas vezes usada de forma coloquial e em contexto menos violento, esta expressão define um comportamento sociopata em que um indivíduo, sem qualquer antecedente de violência, se mune de uma arma e tenta ferir ou matar alguém que apareça à sua frente. Estas crises de "amok" eram normalmente "curadas" com a morte do indivíduo em causa.